De seu primeiro longa, Monstros, o diretor Gareth Edwards traz seu conhecimento em efeitos visuais para imaginar um mundo onde a passagem de criaturas gigantes, embora cause desastres, não parece espetaculosa: são monstros diferentes daqueles de comportamento alienígena ou acuados como o de Cloverfield; aqui eles tratam a terra como seu habitat, e o ambiente se molda a eles. Resta aos humanos se conformar.
Pessoas podem argumentar que a História se repete como farsa, o que nunca deixou de ser verdade, e de fato tem algo de ridículo na seriedade com que o personagem de Ken Watanabe racionaliza este apocalipse fantasioso. De qualquer forma, Edwards se mostra determinado a encenar seu fim de mundo como uma repetição de histórias: o menino que pode ficar órfão como seu pai ficou, o japonês que pode reviver o terror nuclear décadas depois, os pulsos eletromagnéticos que ameaçam jogar a humanidade nas trevas mais uma vez.
O diretor também parece confiante na forma solene, com ocasionais alívios cômicos, com que sua câmera se movimenta lentamente nas lutas dos monstros, como se respeitasse a escala grandiosa com que eles se movem, e lentamente também nas salas onde os humanos decidem o que fazer diante do fim. Essa estrutura díptica é pensada para aproximar essas duas escalas absolutamente distintas, a dos monstros e a dos homens. Então, por exemplo, quando percebe-se que Godzilla não é o vilão, ele passa a dividir com Aaron Taylor-Johnson a figura do herói (o que fica muito claro na cena em que eles vão juntos ao chão).
O que ajuda a diferenciar Godzilla de filmes-catástrofes recentes, que recorrem ao imaginário do 11 de Setembro de forma espetaculosa, como O Homem de Aço, é que Edwards não perde de vista o senso de maravilhamento (e não exploração) diante dos monstros. Como no seu longa anterior, as criaturas se revelam aos poucos, e nunca deixam de espantar. Assim como Cloverfield devia muito a Steven Spielberg nessa ideia de revelação gradual, Godzilla também presta contas ao diretor; é um filme de véus (muita coisa vista inicialmente por janelas embaçadas, por frestas) bem parecido com Jurassic Park, e seu senso de escala para encontrar o drama humano no desastre se aproxima do Guerra dos Mundos de Spielberg, um filme ademais muito subestimado.
Até mesmo a trilha de Alexandre Desplat lembra John Williams, e no fim não há demérito nisso. As fantasias sci-fi de Spielberg continham um senso de encantamento com o desconhecido e de revelação que Hollywood parece perder às vezes, e este filme sem dúvida o recupera.
Autor: Marcelo Hessel
Fonte: Omelete
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